segunda-feira, 12 de novembro de 2018

Amor Virtual

Numa conversa telefónica entre amigas surge, inesperadamente, um cruzamento de linhas.
Três pessoas falavam, entrecruzadamente, em uníssono.
No entanto, sobressaía uma voz masculina.
Voz rouca, quente.
Apaixonante, madura.
Diria mesmo, envolvente ao minuto.
Palavras, frases, risos. Muitos.
Trocadas, agora, entre duas pessoas.
Sómente Ele e Ela.
Antevia-se a possibilidade de um encontro, que podia vir a ser arrebatador.
Ele, professor universitário, africano, solitário.
Solicitava apenas um abraço.
Ardia no desejo de conhecer a rapariga  que tinha descoberto  no outro lado da linha.
Ela, jovem, com a experiência própria da idade e da época.
Fervia no ímpeto de o poder conhecer pessoalmente.
Sucediam-se telefonemas  e, sem ambos perceberem, crescia a vontade de se encontrarem.
Podia ser pecado ou benção, pensavam.
Mas ambos, no presídio dos diálogos envolventes, iam criando um cenário mágico, até à realização do momento que não mais acontecia.
Já tinham esgotado os temas do senso comum. Os temas académicos. E outros.
Falavam à noite, de manhã, sempre que lhes era oportuno.
Aquilo que os unia, para além da linha telefónica, já não era apenas uma brincadeira.
Amizade ou gozo insensato de ter um namoro virtual, poder-se-ia dizer.
O tempo passava velozmente.
Estavam , assim, reunidos todos os ingredientes para o grande momento.
Um belo dia, numa cidade cosmopolita de um país qualquer, encontraram-se!
Não existia amor.
Apenas curiosidade, transformada em pedaços de paixão.
Posse, numa noite que não aconteceu.
Beijaram-se.
Viveram longamente a realidade de um sonho, que afinal não era deles.
Os dois, curvados sobre si próprios,  riram da euforia do desejo.
Do sopro da paixão.
Do corpo inerte, que nada queria.
Caminharam, por fim.
Frente ao mar, esgotaram palavras loucas.
Na sensualidade da maresia , cantaram uma nova razão de existir.
Nas rochas, esculpiram a sensatez perdida na fantasia.
Nos limos, procuraram a realidade.
Na areia, enterraram uma noite anómala de encantamento.
Até hoje!