Contigo na cama
Procuro a tua mão
E o calor do teu amor
Sinto o perfume da relva cortada
Oiço os gatos lá fora
Acordada
Num leito imenso
Naufragamos
Saudoso mar
Em tempo de arco-íris
Procuro a tua mão
E o calor do teu amor
Sinto o perfume da relva cortada
Oiço os gatos lá fora
Acordada
Num leito imenso
Naufragamos
Saudoso mar
Em tempo de arco-íris
O meu jardim é mais bonito que o teu
Lá derramo lágrimas que ninguém sabe
Lá cultivo amores que ninguém vê
Lá enterrarei tuas cinzas
Bem perto da oliveira do canto
Onde os gatos brincam
Com elas faço um altar para o mundo
Onde o inverno se transforma em lembrança
E o vento traz de volta a tua voz
Grito silêncio
Pensamentos enterrados na relva
Ressomam à enxada do jardineiro
No verde do meu jardim
Grito saúde
Margaridas
Papoilas
Trigo e ramo de oliveira
À tarde vou ao campo
Arranjo o ramo
E grito felicidade
4.00 h da manhã
Acordo
Levanto-me
Bebo um gole de água com bolachas
Dou meia dúzia de passos e volto para a cama
O sono não vem
5.00 h da manhã
Um pingo perdido numa torneira qualquer
Velha ferrugenta mal fechada
Não dá tréguas
O sono não vem
6.00 h da manhã
Ontem também não dormi
As meninas do andar de cima
Ensaiavam danças modernas a altas horas
Com saltos e risos muitos
Numa alegria irreverente de juventude
O sono não vem
7.00 h da manhã
O malvado ping ping ping continua
Mais fraco
Menos audível
Corrói-me os neurórios enfraquecidos
8.00 da manhã
Outrora ouvi falar na " tortura do pingo "
??? Alguém se lembra ???
Tenho muito sono
Vou tentar dormir e ESQUECER
No início do ano
As palavras tossem
O comprimido cai
Desafia-me a paciência
Suspensa pela incógnita do tempo
Reinvento dias quase perfeitos
Amanhã vou ao médico
Ninguém sente o que escrevo
Escondo o caderno na lantana já sem flor
E o lápis no buraco da árvore
O pássaro esfomeado
Leva no bico os pontos dos " is "
Todos
Não consigo completar as palavras
Nem as estrofes
Dilui-se o pensamento na relva húmida
Ninguém sabe o que escrevo
Só tu
Mão escondida na oliveira
Atordoada
Atravesso no local habitual
Degusto meia dúzia de degraus polvilhados de fina canela
Enterro-me na areia escaldante
E num mar gelado que me fustiga as pernas
Contente
Canto baixinho para que ninguém me ouça
Danço pequenos passos ao sabor da rebentação
Ao longe vislumbro a Berlenga
Risonha e poética
Olho de novo o mar
Com a brisa que se faz sentir ao fim do dia
Fico a cobiçar a mulher gorda
Que de soslaio me sorri
E corre a mergulhar