Margarida ... a prima que alguns gostariam de ter tido.
Estava todos os dias lá, a seguir ao almoço.
Comigo, com a minha mãe, com as minhas filhas ... sim, especialmente com elas, as meninas!
Tinha pouco dinheiro, e o pouco que tinha era-lhe sugado pela mãe, com quem vivia e a quem tinha que obedecer como se fosse uma criança.
Divorciada, de idade pouco perceptível, tinha uma filha adulta que pouco ou nada lhe ligava. A Maria.
Seca, franzina, sem apelo nem agrado, vestia quase sempre uma saia de tecido espinhado preto e branco, que lhe caía corpo abaixo, evidenciando a falta de curvas. Na cintura, um alfinete de dama apertava o cós que lhe sobrava, com a desculpa de que perdera o botão.
À minha mãe fazia recados. Muitos.
A mim, adorava-me, como qualquer crente venera o mistério de Deus.
Ao meu pai, escutava-o respeitosamente e colhia das suas palavras sábias alguns ensinamentos úteis.
Com as meninas, rejubilava quando as via. Eram o seu entretenimento primeiro. Depositava nelas um carinho mal amanhado, que não soube ou pode dar à sua própria filha.
Todos os dias, antes de chegar a nossa casa, com umas parcas moedas guardadas no corpete, comprava dois pequenos chocolates para dar às meninas, que escondia (para a mãe não ver) nas palmilhas dos sapatos. Cambados de tanta velhice.
Entrava em casa e cumprimentava todos com um ridículo mas afectuoso " Trolaró ".
Sorrateiramente fazia a boa acção do dia, satisfeita por poder dar prazer e alegria, com a dádiva dos Táxi's. Assim se chamavam os chocolates.
Hoje, volvidos muitos anos, no manto da noite recordei este episódio que me deixou nostálgica.
Sem monumentalidade.
Apenas com a certeza do afecto que somos capazes de nutrir por alguém.
" Trolaró ".